Tenho 44 anos. Em 15 de Dezembro de 1996 dei o meu último caldo. Passaram-se 17 anos... Aqui contei parte da minha história...

terça-feira, outubro 24, 2006

Palavras para quê? É mais um artista...

"Anonymous said...
epa e assim e droga e proibida e se eu fosse presidente tembem nao ajudava em nada os toxicodependentes. Se a pessoas neste pais com cancros e que nao tem dinheiro para os medicamentos porque comparticipar os toxicodependentes. Esses so têm o que merecem."



Só me ocorre dizer que este senhor, ou senhora, também tem o que merece, pois o estado também não comparticipa as faltas de inteligência. Sendo assim é mais um caso perdido, sem cura e sem apoios.

Desculpem a minha prologada ausência, mas a pós graduação está a dar cabo da minha paciência. Não abandonei o projecto, como já me perguntaram, não tenho é tido tempo. Garanto que vou contar a minha história até ao fim, mesmo levando com comentários destes.

sexta-feira, outubro 06, 2006

A dor

É verdade que a dor de uma ressaca é algo difícil de explicar ou de comparar, não é uma dor que se possa localizar, não é como uma dor de dentes, ou uma dor de cabeça, por mais fortes que estas sejam não há comparação possível.
A ressaca é um conjunto de dores físicas às quais se juntam um conjunto de dores da alma. Na ressaca todo o corpo dói, desde os rins, às pernas, à cabeça, enfim é um mal-estar geral que por mais que tentes não consegues controlar.
Mas para além dessas dores físicas existe também o resto, os constantes pedidos do corpo para consumir, os tremores e a ânsia de consumir. Há uma ideia que constantemente vem à cabeça de quem está a ressacar, essa ideia é simples: “Para que tudo passe basta consumires um pacote!”
Então entras numa luta contra o inconsciente que te diz vai consumir e o consciente que te diz para não o fazeres.
Das várias conversas que tenho tido com o meu pai sobre este assunto, a ideia que ele me passa é que das coisas mais duras e mais difíceis de controlar durante as minhas ressacas foram as minhas constantes súplicas para me arranjar um pacote de cavalo, era a única coisa que eu pedia.
Mas na nossa vida, à medida que o tempo passa, vamos esquecendo as coisas más e lembrando apenas as boas, por isso rapidamente nos esquecemos do que sofremos e procuramos recuperar aquelas que nos dão prazer, é por isso que muitas vezes se volta ao consumo.
A Maria H conseguiu, no comentário que fez, passar bem esta ideia: “São mesmo horríveis as dores de uma ressaca, mas não é apenas pelas dores sentidas que se muda de rumo. Essas, as dores, vêm e vão como o vento...Não há dor alguma que o ser humano não consiga suportar. Eu mesma suportei as dores de uma ressaca "a frio" ( sem medicação, sem tratamentos) e estou aqui!! Tive dois filhos e acho que custa bem mais!”
O pior são de facto as dores da alma, essas sim ficam para sempre, essas não passam, essas doem todos os dias, por vezes diminuem de intensidade mas não desaparecem, ficam como companheiras para a vida.
O que acontece é que só damos por elas mais tarde. Eu por exemplo, naquela altura, não via o valor do que o meu pai estava a fazer por mim, antes pelo contrário, ele era um “inimigo” que me estava a afastar do prazer e do bem-estar. Naquela altura ainda não tinha decidido parar de vez, ainda achava que podia controlar o consumo, por isso passado pouco tempo, assim que me foi possível, estava de novo a consumir.

segunda-feira, outubro 02, 2006

Três dias e três noites de Ressaca

O meu pai, que por incrível que pareça não suspeitava de nada, ficou como se tivesse levado um soco no estômago. Foi como se lhe tivessem tirado o chão, ficou branco a olhar para mim, sem saber o que dizer.
Sempre pensei que no dia em que o meu vício deixasse de ser segredo, a reacção do meu pai fosse diferente do que efectivamente aconteceu.
Apesar do choque, que por mais que tenha tentado não conseguiu esconder, a primeira coisa que me disse foi, “O que posso fazer para te ajudar?
Já passaram muitos anos, mas não consigo deixar de sentir um arrepio quando me recordo deste episódio, acreditem que estou com as lágrimas nos olhos, não tanto pelo apoio que os meus pais sempre me deram para me ajudar a sair daquele mundo, mas por sentir que mais do que ninguém eles não mereciam a dor que eu lhes estava a impor.
O resto desse dia passou muito rápido, conseguimos ir ainda à psiquiatra que me prescreveu uma série de medicamentos para enfrentar a ressaca que estava a chegar, e o meu pai prontificou-se a passar a noite ao meu lado para me ajudar no que fosse preciso.
Nenhum de nós estava pronto para o que se iria passar naquelas duas ou três noites, nem eu, que já sabia o que era ressacar, fazia ideia do sofrimento que me esperava.
Mais tarde, a minha psiquiatra, viria a admitir que a medicação que me deu pecou por fraca, mas ela era inexperiente no assunto e não se apercebeu que a minha dependência era já muito grande. Ela achava que por eu ainda não me picar não seria difícil ultrapassar a ressaca, mas enganou-se, foi precisamente o contrário. De todas as curas que fiz, mesmo mais tarde quando passei a consumir por via endovenosa, esta foi a mais dolorosa.
O meu descontrolo foi total, acredito que não bati em ninguém e não parti nada porque por natureza não sou violento, praticamente não me lembro com exactidão de nada a não ser da dor nas pernas, do pingo no nariz, dos vómitos, das dores nos rins e do mau estar geral que por mais comprimidos que tomasse não desaparecia.
O meu pai foi um verdadeiro herói, ali esteve três dias e três noites sem arredar pé, e finalmente aos poucos comecei a acalmar.
A primeira coisa de que me lembro depois da ressaca foi a sensação de enorme alegria que senti por ter de novo apetite e não ter necessidade nem de enganar nem de roubar e, claro, de não ter obrigatoriamente de ir consumir.